ainda de dentro do ônibus a primeira impressão não ficou
tão pouco a rodoviária me adiantou o que viria
foram apenas dez minutos de cidade pela janela do táxi
quando finalmente meus pés se encontraram com teu chão, volta redonda,
já não sabíamos quem era o anfitrião e o convidado
sem horário e lugar marcados eu vi tua cidade
eu vi tua cidade de ruas lambidas, estreitas, amarelas
eu vi muitos dos teus carros, alguns carnavalescos
teus motoristas desfilando por uma nota dez
eu vi tua cidade de trânsito respeitoso a caminho do colapso
eu vi o vai-e-vem consumista jogar as âncoras por esses lados
aportar, desembarcar, se infiltrar como se sempre estivesse aqui
eu vi tua cidade de tempo próprio porque tudo parece ter seu tempo em volta redonda
tua falta de pressa arrepia meus pentelhos mais calmos
teu freio de mão puxado incita a besta dentro de mim
eu vi tua cidade-modelo escorregar na passarela e seguir adiante
eu vi teu rosto, tua postura, teus passos, tuas expressões
eu vi tua cidade de crianças assustadoramente livres
teus pequenos demônios à espreita
eu vi teus adolescentes maduros para serem corrompidos em outro lugar
teus meninos, tuas meninas
tuas ligações não atendidas
eu vi teus jovens querendo o futuro
teu nome, volta redonda, em cada um deles
eu vi homens, playboys, mauricinhos exalando superficialidade
eu vi mulheres, patricinhas, dondocas com voz de miado
eu vi teus velhos morrendo na melhor idade
eu vi tua cidade, tua caretice, tua caricatura
teu deus, tua máscara, teus medos, tuas aberrações
teus escândalos calados, tuas indignações sufocadas
eu vi tua cidade de tráfico de drogas, de pontos de prostituição
tuas loucas meninas de programa almejando uma vaga na tv rio sul
eu vi tua cidade de política voltada para frente
tua política levada pelo falso sonho metropolitano
eu vi teus trabalhadores comendo o pão que a csn amassou
eu vi teus artistas oxigenando teu céu cinza, volta redonda
eu vi tua cidade do aço
tua cidade do bagaço
tua cidade, meu passo
teus abraços descoloridos
meus cigarros proibidos
volta redonda, estou a duas horas do meu cordão umbilical
receba esse refugiado de guerra
esse poeta deportado que escolheu ser exilado em tua terra
como outro filho adotado
desses que amam por vias tortas
desses que só sabem amar com as veias expostas
Dio
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